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quinta-feira, 23 de maio de 2013

Panteismo


Eu creio, amigo, que a existência inteira
É um mistério talvez: mas n'alma sinto,
De noite e dia respirando flores,
Sentindo as brisas, recordando aromas
E esses ais que ao silêncio a sombra exala
E enchem o coração de ignota pena,
Como a íntima voz de um ser amigo...
Que essas tardes e brisas, esse mundo
Que na fronte do moço entorna flores,
Que harmonias embebem-lhe no seio,
Têm uma alma também que vive e sente...

A natureza bela e sempre virgem,
Com suas galas gentis na fresca aurora,
Com suas mágoas na tarde escura e fria...
E essa melancolia e morbideza
Que nos eflúvios do luar ressumbra,
Não é apenas uma lira muda
Onde as mãos do poeta acordam hinos
E a alma do sonhador lembranças vibra.

Por essas fibras da natura viva,
Nessas folhas e vagas, nesses astros,
Nessa mágica luz que me deslumbra
E enche de fantasia até meus sonhos,
Palpita porventura um almo sopro,
- Espírito do céu que as reanima!
E talvez lhes murmura em horas mortas
Estes sons de mistério e de saudade,
Que lá no coração repercutidos
O gênio acordam que enlanguesce e canta!

Eu o creio, Luís! também às flores
Entre o perfume vela uma alma pura,
Também o sopro dos divinos anjos
Anima essas corolas setinosas!
No murmúrio das águas no deserto,
Na voz perdida, no dolente canto
Da ave de arribação das águas verdes,
No gemido das folhas na floresta,
Nos ecos da montanha, no arruído
Das folhas secas que estremece o outono,
Há lamentos sentidos, como prantos
Que exala a pena de subida mágoa.

E Deus? - eu creio nele como a alma
Que pensa e ama nessas almas todas,
Que as ergue para o céu e que lhes verte,
Como orvalho noturno em seus ardores,
O amor, sombra do céu, reflexo puro
Da auréola das virgens de seu peito!
Essa terra, esse mundo, o céu e as ondas,
Flores, donzelas - essas almas cândidas,

Beija-as o senhor Deus na fronte límpida,
Arreia-as de pureza e amor sem nódoa...
E à flor dá a ventura das auroras,
Os amores do vento que suspira...
Ao mar a viração, o céu às aves,
Saudades à alcion, sonhos à virgem
E ao homem pensativo e taciturno,
À criatura pálida que chora
- Essa flor que ainda murcha tem perfumes,
Esse momento que suaviza os lábios,
Que eterniza na vida um céu de enleio...
O amor primeiro das donzelas tristes.

São idéias talvez... Embora riam
Homens sem alma, estéreis criaturas,
Não posso desamar as utopias,
Ouvir e amar, à noite, entre as palmeiras,
Na varanda ao luar o som das vagas,
Beijar nos lábios uma flor que murcha,
E crer em Deus como alma animadora
Que não criou somente a natureza,
Mas que ainda a relenta em seu bafejo,
Ainda influi-lhe no sequioso seio
De amor e vida a eternal centelha!
Por isso, ó meu amigo, à meia-noite
Eu deito-me na relva umedecida,
Contemplo o azul do céu, amo as estrelas,
Respiro aromas... e o arquejante peito
Parece remoçar em tanta vida,
Parece-me alentar-se em tanta mágoa,
Tanta melancolia! e nos meus sonhos,
Filho de amor e Deus, eu amo e creio!

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Paraíso tortuoso

E mais uma vez volto de lá cabisbaixo.
Solitário e desolado ao saber que jamais poderei tê-la.
Mas como?
Como poderei sorrir, cantar ou respirar 
com essa atmosfera que me sufoca?
Como não pensar a cada instante naqueles olhos 
que mais parecem janelas abertas direto ao paraíso.
Um paraíso tortuoso que me faz pecar.
Não tem volta, 
me trancaram em um labirinto espinhoso e agora estou condenado.
Ficarei para sempre sufocado e trancado aqui,
do lado de fora do paraíso,
vendo a razão dos meus pecados 
pecando por outro.

Tamires Sousa

Barão vermelho - Flores do Mal



FLORES DO MAL

Não me atire no mar de solidão 

Você tem a faca, o queijo e meu coração nas mãos 
Não me retalhe em escândalos 
Nem tão pouco cobre o perdão 
Deixe que eu cure a ferida dessa louca paixão 
Que acabou feito um sonho 
Foi o meu inferno, foi o meu descanso 
A mesma mão que acaricia, fere e sai furtiva 
Faz do amor uma história triste 
O bem que você me fez nunca foi real 
Da semente mais rica, nasceram flores do mal 
Huummm.... 
Não me atire no mar de solidão 
Você tem a faca, o queijo e meu coração nas mãos 
Não me retalhe em escândalos 
Nem tão pouco cobre o perdão 
Deixe que eu cure a ferida dessa louca paixão 
Não me esqueça por tão pouco 
Nem diga adeus por engano 
Mas é sempre assim 
A mesma mão que acaricia, fere e sai furtiva 
Faz do amor uma história triste 
O bem que você me fez nunca foi real 
Da semente mais rica, nasceram flores do mal. 

Ai Jesus!



Ai Jesus! não vês que gemo,
Que desmaio de paixão
Pelos teus olhos azuis?
Que empalideço, que tremo,
Que me expira o coração?
Ai Jesus!

Que por um olhar, donzela,

Eu poderia morrer
Dos teus olhos pela luz?
Que morte! que morte bela!
Antes seria viver!
Ai Jesus!

Que por um beijo perdido
Eu de gozo morreria
Em teus níveos seios nus?
Que no oceano dum gemido
Minh'alma se afogaria?
Ai Jesus!

Sobre o autor

Dentre suas obras merece um destaque especial a "Lira dos Vinte Anos", composta de diversos poemas. A Lira é dividida em três partes, sendo a 1ª e a 3ª da Face Ariel e a 2ª da Face Caliban. A Face Ariel mostra um Álvares de Azevedo ingênuo, casto e inocente. Já a Face Caliban apresenta poemas irônicos e sarcásticos.

Adeus, meus sonhos!


Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro!
Não levo da existência uma saudade!
E tanta vida que meu peito enchia
Morreu na minha triste mocidade!
Misérrimo! Votei meus pobres dias
À sina doida de um amor sem fruto,
E minh’alma na treva agora dorme
Como um olhar que a morte envolve em luto.
Que me resta, meu Deus?
Morra comigo
A estrela de meus cândidos amores,
Já não vejo no meu peito morto
Um punhado sequer de murchas flores!

Álvares de Azevedo

Meu Sonho




Eu
Cavaleiro das armas escuras,
Onde vais pelas trevas impuras
Com a espada sangüenta na mão?
Por que brilham teus olhos ardentes
E gemidos nos lábios frementes
Vertem fogo do teu coração?
Cavaleiro, quem és? o remorso?
Do corcel te debruças no dorso.
E galopas do vale através.
Oh! da estrada acordando as poeiras
Não escutas gritar as caveiras
E morder-te o fantasma nos pés?
Onde vais pelas trevas impuras,
Cavaleiro das armas escuras,
Macilento qual morto na tumba?.
Tu escutas. Na longa montanha
Um tropel teu galope acompanha?
E um clamor de vingança retumba?
Cavaleiro, quem és? – que mistério,
Quem te força da morte no império
Pela noite assombrada a vagar?
O Fantasma
Sou o sonho da tua esperança,
Tua febre que nunca descansa,
O delírio que te há de matar!.

Álvares de Azevedo